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Antonio Adolfo recria peças de Wayne Shorter

Luiz Orlando Carneiro, Jornal do Brasil, 29/04/2017

 

No ano passado (11/6), esta coluna recomendou o álbum Tropical Infinito (AAM) como uma aula magna de samba Antonio Adolfo-montjazz do reverenciado pianista, arranjador e professor Antonio Adolfo, à frente de um conjunto harmonioso de músicos brasileiros do primeiro time: Jessé Sadoc (trompete, flugelhorn), Marcelo Martins (saxofones tenor e soprano), Serginho Trombone (trombone, é claro), Leo Amuedo (guitarra elétrica), Rafael Barata (bateria), Jorge Helder (baixo), André Siqueira (percussão) e Claudio Spiewak (violão, em três faixas).

Em Tropical Infinito, o professor selecionou, além de composições de sua lavra, joias do repertório jazzístico pós-bop do quilate de Whisper not Killer Joe, de Benny Golson; Stolen moments, de Oliver Nelson; e Song for my father, de Horace Silver.

Basicamente com o mesmo grupo (Lula Galvão no lugar de Amuedo), Antonio Adolfo, hoje com 70 anos, está de volta às lojas virtuais com o CD Hybrido: From Rio to Wayne Shorter (AAM), gravado no Rio, em dezembro do ano passado.

Como anuncia o título, trata-se de um tributo ao saxofonista-compositor que ficou célebre a partir de sua associação com Miles Davis no chamado “Second Great Quintet” (1964-68), e também nos primeiros dois registros da banda fusionista de Miles (Silent Way e Bitches Brew). São ao todo oito peças mais ou menos famosas do tandem Shorter-Davis, mais Afosamba (4m20), original de Adolfo com tempero rítmico na base do samba e do afoxé.

Nas notas de apresentação do novo disco, ele escreveu que as melodias e harmonias da música de Wayne Shorter sempre o influenciaram, e “continuam a influenciar músicos de vários continentes e gerações”. E que, ao mesmo tempo, expressões musicais de diferentes culturas também foram apropriadas pelo grande saxofonista, ainda ativo aos 83 anos. Assim, como explica Adolfo, “o hibridismo do título refere-se a essa mistura cultural de estilos musicais e raças que tem sido um dos motores do meu trabalho”. Anote-se que, neste hibridismo, o jazz é o substantivo, e a música popular brasileira é o adjetivo.

As faixas que abrem o álbum são Deluge (5m50) – peça que Shorter lançou no LP Juju (Blue Note, 1964), com solos animados de trompete (Sadoc) e sax tenor (Martins) – e a irresistível Footprints (6m05) – que Miles celebrizou em Miles Smiles (Columbia, 1966). Na versão desta última, Antonio Adolfo usou no arranjo uma vocalização (sem palavras) de Zé Renato, e deu destaque especial ao guitarrista Amoedo e a Serginho Trombone.

E.S.P. (6m25) e Ana Maria (6m41) são os temas de Shorter que merecem tratamento mais meditativo pelo pianista-arranjador, por Marcelo Martins (no sax soprano) e pelo guitarrista Amoedo. Sobretudo Ana Maria, composição de Wayne lançada no álbum Native Dancer (1974), e dedicada à sua mulher – de nacionalidade portuguesa – que morreu num desastre de avião em Long Island, em 1996.

Completam o repertório selecionado por Antonio Adolfo: Speak no evil (7m40), daquele antológico álbum da Blue Note assim nomeado, gravado em 1964; Beauty and beast (6m45), de Native DancerBlack Nile (4m50), faixa marcante do LP Night Dreamer (Blue Note, 1964); Princess of darkness (6m), de Sorcerer (Columbia), que o quinteto de Miles Davis gravou em 1967.