Violonista João Camarero lança tributo a Baden Powell
Augusto Pio, Estado de Minas, 11/02/2025
Influenciado por Baden Powell (1937-2000), o paulista João Camarero tomou gosto pelo violão e hoje é considerado um dos maiores instrumentistas do país. No disco tributo “Baden” (Borandá), gravou duas composições de seu mestre e três parcerias dele com Paulo César Pinheiro e Vinicius de Moraes.
A ideia foi registrar músicas que não são muito conhecidas, especialmente “Velho amigo”, que Baden Powell fez para o pai.
“Tenho identificação com elas. Sei que é ambicioso fazer isso em cinco faixas, ainda mais com um cara do tamanho do Baden, mas, de certa maneira, o disco é um pequeno mosaico”, explica João Camarero.
“Para mim, ele era um assombro”, diz, citando o Baden Powell compositor de canção e o Baden Powell compositor de samba, como é o caso de “Voltei”, a primeira das cinco faixas do disco. As outras são “Introdução ao poema dos olhos da amada”, “Chará” e “O astronauta”, além de “Velho amigo”.
Camarero conta que “Chará” é uma peça superviolonística, uma delícia de tocar.
“É muito rítmica, muito badeniana.” Já “Introdução ao poema dos olhos da amada” foi feita para o poema “Os olhos da amada”, de Vinicius de Moraes. “É superlírica, muito bonita. Essa música tem uma certa mística para mim, pois foi por causa dela que me apaixonei pelo trabalho de Baden”, revela.
Na época, João tinha 15 anos e começava a tocar violão. Impressionou-se com o disco “Solitude on guitar” (1971), que encontrou na casa de um tio.
“A primeira faixa era ‘Introdução ao poema dos olhos da amada’, fiquei extasiado. Até tem um texto de Clarice Lispector, no qual ela fala sobre Brasília. Fala do espanto com a beleza da imensidão. Tive sensação muito parecida”, relembra.
Devo muito ao Baden o fato de ter me dedicado ao violão, até acho que esse encontro aconteceria mais cedo ou mais tarde, foi uma questão de tempo mesmo. Diferentemente dos meus outros álbuns, que têm conceito um pouco diferente, pois misturo música clássica”, observa. Com o repertório de “Baden” ele se sente mais à vontade: “Estou mais em casa.”
Seu álbum procura oferecer “um certo panorama” do que era o violonista e compositor fluminense. Se a faixa “O astronauta” é parceria emblemática com Vinicius de Moraes, a valsa “Velho amigo” mostra a faceta “do Baden seresteiro e do choro”.
Camarero, de 34 anos, é expert em Baden Powell, considerado um dos violonistas mais talentosos do mundo. O artista fluminense morreu cedo, aos 63 anos, vítima de pneumonia bacteriana. Menino, estudou com um craque: Jayme “Meira” Florence (1909-1982), que também ajudou a formar outro prodígio: Raphael Rabello (1962-1995).
“Temos ali o que há de mais fino do violão brasileiro, a ligação com o choro e a música popular urbana do Brasil. Meira veio do Nordeste e tocou com João Pernambuco, Agustin Barrios e Dilermando Reis, era um intelectual da música”, afirma Camarero.
Até enterro
“Baden contava que Meira fazia umas rodas na casa dele com Pixinguinha e um pessoal da pesada e o colocava para tocar. Falava para Baden: ‘Senta aí e toca baixinho, se souber. Mas se não souber, não toca’. Baden dizia que embora tivesse 13 para 14 anos, isso fez com que já estivesse pronto para tocar. Dizia que acompanhava até enterro caso precisasse, pois estava pronto”, diverte-se Camarero.
“A gente tem um violão riquíssimo. É uma força, riqueza cultural do nosso país. Um estilo, um gênero, o jeito de tocar que abre portas no mundo inteiro. Então, é importante a gente valorizar isso aqui dentro de casa. É preciso olhar para a obra de Baden Powell com muito respeito”, conclui.
BADEN POWELL
Fluminense de Varre-Sai, Baden Powell começou a tocar violão aos 7 anos. Adolescente, apresentava-se em bailes, rádios e casas noturnas do Rio de Janeiro. Transitava com desenvoltura entre as músicas clássica e popular.
Baden gravou cerca de 70 discos e foi parceiro importante de Vinicius de Moraes: a dupla compôs 50 canções, entre clássicos da MPB e os afro-sambas, que imprimiram novos contornos à bossa nova. Nos anos 1960, mudou-se para a França e morou na Alemanha, chamando a atenção do mundo para seu violão. Baden é pai do pianista Philippe Baden Powell e do violonista Louis Marcel Powell.