O caldeirão de sons do bruxo Rodrigo Nassif
Wilson Garzon – O interesse pelo violão e pela milonga são heranças familiares ou vieram cada um a seu tempo?
Rodrigo Nassif – Diria que o interesse pela música regional, assim como o jazz, sim, vieram de berço. Meu pai chegou a tocar clarinete e conjugava uma paixão pelo repertório do folclore gaúcho com uma paixão por bebop, swing e especialmente por Charlie Parker. A família de minha mãe também tem vários músicos amadores, fãs de serestas e sambas. Então, creio que era um ambiente natural para que pelo menos da família terminasse por envolver-se mais profundamente. Já o interesse pelo violão surgiu depois de uma fase apaixonado pela guitarra e pelo contrabaixo, e pelo repertório de rock clássico que me foi apresentado pelo meu irmão.
WG – Quanto foi que o jazz bateu à sua porta e pediu para entrar?
RN – Olha, dado o interesse do meu pai , não só por jazz, mas por instrumentais em geral, creio que sempre esteve presente desde a infância , apesar de ter uma fase mais roqueiro enquanto adolescente, nunca deixei de curtir aqueles sons ligados intimamente a vida afetiva , como Miles Davis, Jaco do Bandolim, Aníbal Troillo etc… Mas sem dúvida um contato proporcionado por um colega de faculdade com músicos americanos no começo da minha graduação em música me influenciou demais!
Rafael Campanile , meu colega de graduação em violão, largou a faculdade no RS e foi estudar baixo nos EUA, quando voltou trouxe a tiracolo um guitarrista fantástico com ele, o Craig Ovens , e isso foi um choque: quando vi aquele cara pensei: nossa , isso é real …dá para tocar cada vez de um modo diferente mesmo…….foi um choque!
WG – Quais foram suas principais influências na consolidação de seu estilo musical?
RN – Creio em um leque bastante amplo de influências : Piazzolla Jobim, Hendrix, Coltrane… Tudo depende para qual lado a composição pende naturalmente quando estamos fazendo os arranjos em conjunto. Creio em deixar que o arranjo de manifeste naturalmente e tenho uma enorme confiança nos músicos do nosso quarteto.
WG – Antes do quarteto, você participou de que projetos e grupos musicais?
RN – Participei de vários tipos de formações : bandas de rock na adolescência, combos de jazz na graduação e um bom tempo fazendo recitais de violão solo, bandas de MPB na noite…Enfim, cobri várias áreas antes de me aventurar pela composição.
WG – Quando foi formado o quarteto e qual foi o seu conceito? Como se deu as escolhas dos músicos?
RN – Na verdade, não começamos como quarteto, fizemos várias experiências na formação: 2 violões e percussão; violão, guitarra e sitar; 2 violões e mandolim e por último, tentamos com o Samuel no baixo elétrico e aí as músicas ganharam um peso e um swing inéditos! Terminamos por optar por esta última formação em prol do efeito que desejávamos para a maioria das músicas. Também nos aproximamos não somente pela prática musical, mas por muitas convivências e amizades em comum, o que espontaneamente torna a convivência mais agradável e as colaborações mais espontâneas.
O Leandro, nosso baterista, apareceu por amigos em comum. O mesmo se deu com o Carlos, nosso violonista e o Samuel, nosso contrabaixista que foi quem foi convidado por último. Ele já convivia com a gente há algum tempo, e só em uma viagem que fizemos junto com nossas esposas que são amigas, que fiquei sabendo que ele também era um bom músico que conseguia tocar de maneira bem swingada, e era o que eu buscava em um baixista.
WG – Seu último trabalho, Todos os dias serão outono, como foi o processo de gravação?
RN – Como sempre, gravamos todos os ensaios e chegamos a uma conclusão comum de que devíamos registrar as músicas ao vivo no estúdio com a mesma linha de raciocínio dos jazzistas que faziam isto até a década de 50. Como sempre temos cumprido uma boa agenda em SP, voltamos aquecidos a POA e registramos todo o disco em um único dia , 01/05/2015 , ao vivo no estúdio Panamá em POA, Contamos com uma master maravilhosa do Marcos Abreu que é aqui do RS mesmo e que compreender completamente o espírito do nosso disco.
WG – O repertório do cd é composto por 11 composições autorais. Conte-nos um pouco sobre cada uma delas.
RN – ‘Historia Diferente’ e ‘l Scretch de la Mula’ – estas duas estão coladas, a primeira tem um clima de otimismo total e tem um poema em, homenagem à seleção uruguaia de futebol de 1950. É uma música com sonoridade acelerada, vibrante, organizada e solar; já ‘Del Scratch dela mula’ é totalmente o contrário: caótica, tensa, soturna um candombe estilizado; ‘Fronteira’ – outro tango, título original era ‘Contrabando na fronteira’ e é uma tentiva de descrever musicalmente esta atividade;
‘Fendas’ – balada para aliviar os ouvidos O que eu disse e o que eu quis dizer: tem uma forma de canção na parte A, depois partimos aos improvisos e ao final retoma o tema cantabile;
‘Citadina’ – descreve uma vida nas megalópoles, com ritmo acelerado e bateria de hip hop na segunda e terceira voltas;
‘Todos os dias serao outono’ – aqui a faixa título: é uma viagem afetiva , uma melodia fácil de ser decorada e depois um jazz pegado, depois volta a melodia fácil, com uma batera a la ‘The Who’;
‘Balada de los Buendia’ – inspirada em Gabriel Garcia Marquez. Arranjo para quarteto de uma composição do primeiro disco, é um tango, com a sonoridade áspera e rascante;
‘Valsa Hesitante’ – o título é auto-explicativo;
‘YMB’ – é tipo música afro;
‘Tema da saudade’ – um estudo de tremolo , evocativo e sentimental.
WG – Como está sendo a performance do cd junto a shows e eventos? E quanto à repercussão crítica?
RN – Temos recebido uma aceitação impressionante do nosso primeiro disco; virou trilha de curta da FOX5 de Nova York. Também está sendo requisitado por rádios FM especializadas em Jazz dos EUA , como a K-MIX de Los Angeles considerado referência nacional e também ficou presente em diversas listas de melhores do ano. Temos feito vários shows nos melhores palcos de SP tais como: Teatro Anchieta do Sesc Consolação, JazzB, Fundação Ema Klabin , Sesc Pinheiros, Sesc Vila Mariana , etc…
WG – Quanto aos próximos projetos, o que você tem no horizonte?
RN – Queremos lançar nosso segundo disco ainda este ano, que tem o título provisório de: Ainda estou aqui, inspirado pelo livro do Marcelo Rubens Paiva e pelo que essa recepção maravilhosa que nosso primeiro disco recebeu , ficando em primeiro lugar em todo o Brasil nas paradas de música digital, creio que iremos lançar nosso segundo album no mesmo formato digital. Iremos participar do Festival de Jazz e Blues do Sesc SP em São José do Rio Preto e Ribeirão Preto dias 25 e 26/08 e provável que tenhamos uma data na capital paulista próxima a estas datas. Muito obrigado Wilson! Grande abraço.