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Hiromi Uehara, Theatro Municipal (RJ), 25/09/16

O velho e bom amigo Paulo Cesar Nunes, esteve presente nesse show que iniciava a excursão de Hiromi pela América Latina. Envolvido e emocionado com essa grande apresentação da arte jazzística, escreveu essa matéria para que os leitores do Clube de Jazz também pudessem desfrutar desse grande espetáculo.

hiromi-montagem

Neste domingo chuvoso, cheguei cedo ao belíssimo Theatro Municipal do Rio de Janeiro, para a primeira apresentação da pianista japonesa Hiromi Uehara na cidade. Ela se apresentou sem seu The Trio Project, formação com que ela vem se tocando nos últimos anos, junto ao baixista Anthony Jackson e ao baterista Simon Phillips, grupo que tem aclamação total de crítica e público, com discos e shows memoráveis pelo mundo afora.

A produção informou, via site, que um dos músicos teve problemas de saúde e todo o tour foi alterado. No começo do mês ela fez uma apresentação solo em Tokyo, depois duos de piano com Michel Camilo e Akiko Yano também em Tokyo, e agora começou a etapa sul-americana toda com apresentações solo no Brasil, Argentina e Chile. Ainda no mês de outubro começa a etapa europeia com o The Trio Project, agenda lotada até o fim do ano. Hoje entendemos que a formação pouco importa, o importante é a Hiromi.

O público carioca a estava aguardando há tempos; este show chegou a ser anunciado no ano passado, mas foi cancelado. Desta vez, com o palco máximo da música clássica completamente lotado, a pequena prodígio justificou amplamente tamanho frisson e idolatria em torno de sua presença em todo lugar onde se apresenta.

A figura é de uma adolescente oriental de cara bem sapeca, roupas multicoloridas e penteados extravagantes. A postura ao piano é de uma experiente artista do mundo clássico. As execuções no entanto, são de surpreender qualquer espectador que já tenha visto grandes pianistas na vida. Irrequieta, emotiva, bem humorada, criativa e bastante atrevida, monotonia é o que jamais se encontra durante os mais de 90 minutos de show impecável.

Muito simpática, ensaiou varias palavras em português e leu frases que escreveu para apresentar os temas. Fez questão de apresentar seu companheiro da vida toda, o piano. Não dá para descrever tudo o que ela fez em cada tema com tantas variações de estilos então considerem que ela percorreu o boogie, ragtime, jazz tradicional com toques de stride e piano blues, climas de saloons e cabarets dos anos 30 e daí saltando para o bebop e o jazz contemporâneo, com frases propositalmente dissonantes de muita elegância, uma montanha russa sonora – ela parece saber o que querem ouvir antes de subir ao palco!

Ela começou tocando Cape Cod Chips, seguiu com Sicilian Blue e fez suas incursões em português para anunciar a belíssima BQE. Entrou num tema mais suingado, Seeker, e de novo interrompe para anunciar um tour de force em seus shows, o belo épico Old Castle by The River in the Middle of a Forest, e ela conseguiu ler isto traduzido em português! Desconstruiu um tema do barroco, Canon in D, de Pachebel, e aqui ela usa o corpo do microfone sobre algumas cordas, esta seção passa a soar estranha mas próxima ao som do cravo, para depois mergulhar a peça no mundo do jazz. Soberba!

Para encerrar convida a platéia a visitar Las Vegas e anuncia mais uma suite que sempre executa em seus shows solo, a Viva! Vegas, onde soma três temas: Show city, show girl, Daytime in Vegas e The Gambler. A técnica e o feeling andam juntos e muitas vezes parecem duas pianistas, ela chega a duelar consigo mesma! Foi ovacionada, com a plateia inteira de pé!

Voltou para o bis com seu tema mais triste e belo, Place to be. Se despede e sai do palco mas o publico pede e ela volta para um poutpourri: I’ve Got Rhythm, de Gershwin, com inserções de The Entertainer (Golpe de Mestre), o tema dos Flinstones, e por aí se embrenhou, com fraseados pra lá de complexos mas com muito bom humor. Cada tema foi uma experiência única com harmonia e improviso suficientes para agradar qualquer mortal ou imortal.

Mesmo os mais exigentes entusiastas do jazz moderno ou os tradicionalistas dos primórdios, todos estavam extasiados diante de tamanha desenvoltura. Como ela consegue? A música de Hiromi Uehara não se ouve com os ouvidos. Se ouve com o coração! Esta semana estará ainda em São Paulo e Porto Alegre e parte para Buenos Aires onde vai lotar o Coliseo em duas datas e depois para Santiago. Esperemos que volte ao Rio em breve.