Um olhar na música de Tomás Improta
Desde os anos 70, quando o pianista Tomás Improta despontou como uma grande revelação dentro cenário de nossa música instrumental, ele desenvolveu uma carreira brilhante, não só como músico, mas também como compositor, arranjador, professor e autor de livros. Entre os cds autorais já lançados, destacam-se “Bartok Jazz”, “Certas Mulheres”, “Dorival” e “A Volta de Alice”. Nessa entrevista exclusiva ao site Clube de Jazz, Tomás aborda não só sua formação e carreira musicais, mas também o lançamento de seu último trabalho, o cd solo “Olha pro Céu”.
Wilson Garzon – Tendo pais pianistas e dedicados à musica clássica foi inevitável a sua escolha por esse instrumento. As opções pelo Jazz e Mpb a partir dos anos 60 também foram inevitáveis?
Tomás Improta – Embora meus pais fossem pianistas, fui levado a encarar, por muitos anos, a atividade de músico como um hobby ou no máximo uma segunda opção de trabalho. Na verdade eu fiz engenharia até os 21 anos, embora desde os 16 anos realizasse alguns trabalhos profissionais como músico. Mesmo assim, por conta de meu pai ter sido critico de música clássica de um dos maiores jornais do Brasil, o “Correio da Manhã“, a vida toda fui muito bem amparado por excelentes professores de piano e também de composição.
Gosto de muitos gêneros musicais e o jazz e a bossa-nova, são grandes paixões. Quando eu tinha uns 6 ou 7 anos apaixonei-me pelo Ray Coniff, que tinha um pouquinho de jazz. Depois, sem me dar conta, fui aproximando-me aos poucos de instrumentais com improviso, um jazz diluído, mas que servia pro adolescente, até que com uns 15 anos, fui levado a casa do Jorge Guinle aonde ouvi o melhor do jazz por três inebriantes noites. O Jorge Guinle foi um playboy famoso que adorava jazz e até escreveu livros sobre o jazz, e meu pai tinha uma empresa interessada em trazer um grupo de jazz, e trouxeram, o Modern Jazz Quartet, escolhido com a ajuda do Guinle.
A bossa-nova pintou pouco tempo depois, e me lembro muito do inicio, a minha tia achando que o João Gilberto desafinava e que ele confessava ao cantar o “Desafinado”. Naquele tempo, a rádio e a tv não eram dominados completamente pela industria comercial da música, e várias rádios tocavam bossa-nova que chegou até a virar moda. Era muito gostoso vc acompanhar diariamente o surgimento de novas canções geniais e também vários compositores pelo rádio e também pela TV.
WG – Antes de desenvolver a sua carreira solo, você se dedicou ao trabalho de estúdio, shows e direção musical de grandes artistas da música brasileira, além de exercer a sua face composicional em trilhas e temas. Pode-se dizer que foi um período de experimentação e desenvolvimento como músico?
TI – Sem dúvida que foi. Eu vinha do jazz e da bossa nova e aprendi muito com meus colegas músicos que tinham outras influências. Porém, eu não tinha a liberdade que tenho com meus trabalhos autorais em experimentar muito.
WG – Conte-nos um pouco sobre o grupo Mandengo (proposta, formação, repertório)
TI – O Mandengo foi um grupo instrumental, de samba jazz, com maravilhosos músicos que pouco tempo mais tarde se tornaram referencia em seus instrumentos.Tinha um trio de sopros: Mauro Senise, Raul Mascarenhas (que há algum tempo mora e trabalha em Paris) e meu querido Barrozinho, falecido ha uns 10 anos.
O contrabaixo era o Tony Botelho, o mais novo, devia ter uns 17 anos. Nós tínhamos por volta de 23 anos mas o Barrosinho era mais velho, ninguém nunca soube a real idade dele. O baterista era o Duduka da Fonseca, consagrado em NY como um dos melhores baterista de samba jazz. O Mandengo acabou porque fui chamado em 76 para tocar com os Doces Bárbaros, e com eles eram muitas viagens.. Mas um pouco antes disso o Duduka foi morar nos EUA e quem o substituiu foi o lendário Edson Machado.
WG – A partir dos anos 90, com mais de 40 anos, você inicia sua brilhante carreira como solista. Porque só agora e não antes?
TI – Eu fiquei muito ocupado tocando com um monte de gente e às vezes ao mesmo tempo, por uns 15 anos. Quando resolvi dar uma parada, abri uma grande escola no Rio, o Cenário, e aí foi o contrário, me dediquei completamente a escola, escrevi quase 20 livros didáticos por conta disso. Mas fiquei infeliz com essa escolha e depois de 3 anos à frente da escola, voltei para a música. Daí comecei o meu trabalho autoral. Que, financeiramente, não é fácil empreender, pagar estúdios, músicos etc.
WG – Esse ano você acaba de lançar “Olha pro Céu“. Ele é um desenvolvimento do trabalho apresentado em “A Volta de Alice” ou tem um outro conceito?
TI – Um conceito completamente diferente, porém foi circunstancial. Em “A Volta de Alice“eu tive uma produção rica através da captação de recursos de empresas, e pude contratar quase 20 músicos, e diversifiquei o máximos os estilos. Neste “Olha Pro Céu” a produção era de apenas uma pessoa, usando seus próprios recursos particulares e aproveitei para fazer um contraponto entre os dois e gravei praticamente só piano.
WG – Das sete músicas que compõem o repertório, duas são de sua autoria “Silvestre: Nascente do Rio Carioca” e “Karen B“. Elas foram criadas para esse trabalho? Qual foi a concepção de cada uma delas?
TI – A “Karen B” foi composta há uns 30 anos, mas não tinha uma segunda parte, fiz para a gravação. A “Silvestre: Nascente do Rio Carioca” eu fiz há uns 5 anos, mas estava também incompleta, quando um amigo cineasta fez um documentário sobre o Rio Carioca e me pediu a música, então eu a completei e acabei gravando no meu CD.
WG – As outra cinco gravações pertencem a autores de alta estirpe (Tom, Villa, Edu, Ary e Cole). A presença deles é uma homenagem a esses gênios por sua influência em sua obra?
TI – Estes compositores, sem dúvida, estão entre os meus preferidos; se você toca a música de alguém, sempre estará homenageando esse alguém. Foi uma escolha, sem querer querendo, dos meus compositores prediletos.
WG – Conte-nos sobre as participações de Tony Botelho e Gabriel Improta nesse cd solo.
TI – Fiz um show com músicas de meu outro cd, “Dorival” e o produtor do “Olha Pro Céu” estava assistindo; ele adorou e daí partiu o convite pro CD “Olha Pro Céu“. O baixista era o Tony Botelho. Daí quando pensamos num baixo para Silvestre, chamei o Tony. O Gabriel tem gravado quase todos os meus últimos Cds; além de ser meu querido filho, ele toca pra caramba. Pra fugir do peso de mais um pianista na família, ele foi para o violão.
WG – Como está sendo o processo de divulgação desse seu trabalho? Pretende levá-lo a outras cidades?
TI – Nos temos uma divulgadora maravilhosa, a Nani, e também foi contratada pela “Sonora“, uma empresa de distribuição pelas livrarias de todo Brasil e também pela mídia virtual.
WG – Quais projetos você está pensando em desenvolver para os próximos anos?
TI – Eu estou gravando no meu computador algumas coisas eletrônicas, com muito ritmo e timbres inusitados. Estou muito animado com isso. Também gostaria de fazer um trabalho de vanguarda com ritmos acústicos, como o maracatu e outros de origem africanas e teclados.
Tenho feito um trabalho só com músicas do samba-canção, que são maravilhosas, baseado no livro do Ruy Castro “A Noite do Meu Bem“. O próprio Ruy participa palestrando. Com o Ruy também fizemos o Samba jazz, o instrumental da bossa-nova, baseado num outro livro dele, sobre este tema. Esse show por exemplo, seria ótimo se fizéssemos em outros lugares.
Olha pro Céu – CD