A nova ‘Fronteira’ de Rafa Castro
O Clube de Jazz abre a temporada de 2018 em grande estilo. A matéria escolhida foi a entrevista com o pianista, acordeonista e compositor mineiro Rafa Castro. Ele acabou de lançar seu terceiro trabalho, “Fronteira”, após ter apresentado “Casulo” e “Teias”, em parceria com o também pianista Túlio Mourão. “Fronteira” apresenta um Rafa não só como um virtuoso em seu instrumento, mas principalmente a sua face de compositor e cantor, numa produção refinada e de alta qualidade.
Wilson Garzon – Você já nasceu predestinado a ser pianista ou a escolha foi demorada?
Rafa Castro – Não tenho músicos na família, mas fui influenciado pela naturalidade que é ter música sempre por perto. Estudei violão e teoria musical dos 13 aos 15 anos, mas nunca consegui entender, pois achava que era um instrumento sem muita lógica e sequência. Foi aos 19 anos que tive minha primeira experiência com o piano, e tudo o que eu tinha aprendido até então, fez sentido.
A partir dai, minha relação com esse instrumento foi muito intensa. Com alguns meses passei na prova da Universidade de Música Popular Bituca, em Barbacena (MG), onde estudei com Ian Guest, Felipe Moreira, Gilvan de Oliveira, dentre outros grandes nomes. Fui me envolvendo cada vez mais, e descobri na música uma forma de me encontrar no mundo. Aos poucos a música foi direcionando todo o meu foco e me levando naturalmente pelos caminhos que venho percorrendo.
WG – A sua base foi a música clássica? Quando o jazz bateu à sua porta?
RC – Não tive formação erudita, mas sempre fui um apaixonado como ouvinte. Minha formação é inteiramente popular e o Jazz entrou na minha música exatamente pela sua concepção de liberdade de criação e inventividade. A música popular permite uma contribuição forte da personalidade do instrumentista e isso me cativa muito.
WG – Como se deu o encontro com Túlio Mourão? O projeto “Teias” foi fundamental na sua consolidação como instrumentista?
RC – No ano de 2011 fui um dos vencedores do Prêmio BDMG Jovem Instrumentista em Belo Horizonte e por essa conquista, poderia escolher uma figura da cena de Minas Gerais para ter aulas. Não pensei duas vezes. O Túlio Mourão sempre foi uma referência do piano na minha vida. Foi um dos motivos de me enveredar pelo jazz mineiro, de me encantar pelas harmonias e melodias incríveis da música das montanhas das gerais. Tanto pelas gravações históricas com os ícones do nosso cancioneiro popular, tanto pela sua carreira solo.
Tivemos nossas aulas em 2012, e foi mais surpreendente que imaginava. Túlio não estava habituado a dar aulas formalmente e isso fez que nossos encontros caminhassem por conversas profundas sobre o valor da música na vida do homem, discussões sobre estética, escutas de grandes músicos, analises de arranjos, compartilhamento de experiências musicais, tocar bastante juntos, além de me proporcionar saber de histórias incríveis sobre os bastidores da nossa MPB. Enfim, foi na verdade um grande tutor da minha formação enquanto artista.
“Teias” é um autentico emaranhado de vertentes artísticas. Tecidas em cores, linhas, luzes e sensações. O formato permite uma enorme riqueza melódica, harmônica , rítmica e de timbres. A concepção do trabalho explora o piano em todas as suas possibilidades, prezando pela liberdade criativa com muito espaço para improvisação e contribuição individual para a sonoridade. O projeto foi pré-selecionado ao Prêmio da Música Brasileira e segue encantando e arrebatando a plateia por onde passa. Ou seja, Túlio é uma pessoa muito importante na minha formação e é uma alegria enorme tê-lo como amigo e poder dividir minha música e minha história com essa pessoa que tanto admiro.
WG – Esse ano, você acaba de lançar “Fronteira“. Em termos de conceito você abre um caminho voltado para a canção. Qual a razão dessa mudança?
RC – Eu sempre tive uma afinidade tremenda pela canção. Cresci ouvindo Milton, Chico, Edu, Tom entre outros. A palavra sempre foi muito significativa para mim e me propus o desafio de encontrá-la dentro do meu trabalho. Nesses últimos tempos tenho me dedicado a unir a música instrumental ao meu canto. É uma fronteira que me desperta muita força e assim nasceu todo o sonho do disco novo. Unir dois mundos que não são comumente comunicáveis, mas que para mim nos dias de hoje, é a completude do meu trabalho.
WG – Quanto tempo levou o projeto, da concepção até a sua finalização?
RC – Acredito que o processo todo tenha levado cerca de 2 anos. Desde a concepção da ideia, inicio das composições, a busca de parceiros letristas, formação do grupo que iria gravar o disco, a escolha do produtor, do estúdio…enfim….foi um processo de muita entrega e participei ativamente de todas as etapas.
WG – O repertório é composto por dez músicas de sua autoria. Você poderia nos contar sobre o processo de criação delas?
RC – Fronteira foi um momento de descobrimento e novas experiências para mim. Trago toda carga afetiva das minhas influências musicais mineiras, principalmente pós Cd/Dvd Teias que pude participar ativamente da música com um dos representantes do Clube da Esquina que é o Túlio Mourão, num duo de pianos raro na música popular brasileira, e minha experiência e mergulho na composição de trilhas sonoras.
Consegui juntar dois pilares que são muito latentes no meu trabalho, e acredito que cheguei num resultado real do que estava fazendo sentido para mim. Nesse disco, acredito que descobri minha maneira de pensar e expressar artisticamente minha identidade. Comecei a pensar seriamente sobre meu papel e sobre minhas virtudes.
WG – Como foram feitas as escolhas dos músicos? De canção em canção?
RC – Todas os músicos que participam do projeto tem a versatilidade de serem grandes instrumentistas de jazz, terem uma ligação forte com a música instrumental, mas ao mesmo tempo são grandes conhecedores do cancioneiro popular brasileiro . Desde o produtor musical, Luis Ribeiro, os músicos da base, o arranjador de cordas (Neymar Dias) e as participações especiais ( Teco Cardoso, Léa Freire, e a super Mônica Salmaso) todos costuram muito bem esses dois universos e foi essa linha que conduzi para as escolhas de todos que estariam comigo nesse projeto.
WG – E o processo de lançamento como está? Tem um roteiro para outras cidades?
RC – Os shows de lançamento do disco tem previsão de começar a partir de Fevereiro/ Março de 2018 e temos convite de varias capitais, mas a ideia é tentar chegar ao interior com a mesma força. Pretendo articular para que esse projeto alcance o maior número de pessoas que estejam abertas para esse encontro da música instrumental e da canção. Tenho a honra de ter excursionado com minha música e ter sido muito bem recebido em lugares que nunca imaginei. Passando por grandes festivais e palcos na Itália, Portugal, Alemanha, Russia, França, Noruega, Estados Unidos, Hungria e outros mais.
E tenho a alegria de já ter vários convites para voltar a esses palcos com o disco novo. Além disso uma grande distribuidora japonesa está realizando a circulação de minha música por todo o país. Ainda é uma loucura para mim, mas bom saber que minha arte é universal e consigo tocar o coração das pessoas e derrubar as barreiras de diferentes culturas. Agora pretendo ir pra lá em breve, realizar alguns shows nesse país que tanto me instiga.
WG – Quais são seus próximos projetos/sonhos? Novas fronteiras?
RC – Meu projeto hoje é canalizar minhas forças para circular com esse disco, e acredito que naturalmente vão surgindo novas concepções e criações pelo caminho. Por enquanto não quero distrair o foco, quero trabalhar nesse disco, pois acredito que ele merece.
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