Entrevistas

Versus, grupo formado por 4 líderes do jazz argentino atual, lança => “VS”

Carlo Salatino, www.tempoar.com.ar, 28/08/2023

Quatro líderes do jazz argentino atual acabam de formar Versuso novo grupo que publicou seu primeiro álbum, VS, que combina a pulsão característica do gênero com uma combinação inteligente de novas sonoridades.

Estes vêm dos teclados de Esteban Sehinkman (sintetizadores e piano Fender Rhodes) e, especialmente, do saxofonista Gustavo Musso (EWI –Electronic Wind Instrument). A eles se juntam Daniel Pipi Piazzolla na bateria e Mariano Sívori no baixo elétrico.

O caráter com que o quarteto aborda cada faixa do disco oferece ao ouvinte uma experiência em que a surpresa se faz presente, levando-o a paisagens sonoras irreais e, por vezes, oníricas. Prova disso é “Marrakech”, que traduz sonoramente a experiência que Sehinkman reuniu a partir das suas vivências numa viagem a Marrocos. Se, como muitas vezes se afirma, a música é uma linguagem universal, a proposta sonora do Versus pode ser ouvida aqui, ali e em qualquer lugar.

Os integrantes do novíssimo grupo conversaram com Tiempo Argentino sobre o novo projeto que os tem como protagonistas.

 

 

Carlo Salatino = Como surgiu o projeto Versus?

Gustavo Musso – Durante a pandemia, surgiu com Esteban a ideia de começar a testar as possibilidades do EWI (Instrumento Eletrônico de Sopro) com seus teclados. Estava praticando bastante, pois não é um instrumento de sopro convencional.

CS = É como uma espécie de sintetizador que você sopra…

GM – …É assim, pois não possui teclas mas sim sensores e a sonoridade e expressividade são obtidas de uma forma diferente do que, por exemplo, com um sax e requer necessariamente uma reformulação técnica por parte do intérprete. Ou seja, tive um período de aprendizagem que coincidiu com esse período de confinamento. Entrei em contato com Esteban e comecei a enviar-lhe algumas melodias e ideias para que ele pudesse começar a trabalhar harmonicamente.

Esteban Sehinkman – Começamos com “Parker’s Mood” de Charlie Parker e ficamos surpresos com o resultado. Além disso, não tínhamos muitas referências de como trabalhar com teclado e esse instrumento que tanto ele quanto eu estávamos começando a conhecer. Por isso,nos abriu um panorama sonoro de grande liberdade, do qual aproveitamos. Então começamos a trabalhar as composições de forma imparcial e sem conceitos prévios, pois, para nós dois, era um campo absolutamente novo.

CS = Quando se pensa no EWI, a referência mais direta é a utilização feita por Michael Brecker em Steps Ahead, que era uma espécie de Weather Report dos anos 80.

ES – É lógico que assim seja porque naquela época ele estava colaborando com o desenvolvimento do instrumento. Talvez sempre tenha alternado com o sax, mas sua referência é fundamental quando se pensa no instrumento.

Mariano Sívori – Naquela época Michael Brecker usou para dar outro colorido à música do grupo. Considere que Mike Mainieri também alternou o vibrafone convencional por outro que possuía MIDI (Musical Instrument Digital Interface), além dos teclados.

GM – Começamos a tentar gravar algumas músicas, nos emocionamos e descobrimos novas sonoridades nas periferias do jazz. Finalmente acabamos montando um álbum chamado Mutable, que lançamos em 2021 e que, de certa forma, é o antecessor do Versus.

ES – O problema é que a percussão foi gravada eletronicamente, o que dificultou a gente tocar ao vivo. Não é interessante ver dois músicos fazendo improvisações baseadas em padrões de jazz com base rítmica acionada por computador. Surgiu então a possibilidade de chamar Pipi e Mariano para tocarem ao vivo e, no processo, criarem um novo projeto.

Pipi Piazzolla – O que também acontece é que somos basicamente “tocadores”. Aqueles de nós que tocam jazz não podem tocar a mesma coisa que ontem, ou anteontem, ou anteontem. Caso contrário estaríamos fazendo outros tipos de música, com roteiro, escrita ou como você quiser chamar. O que fazemos é brincar em cada apresentação com o que acontece em cada momento. Essa é a essência do jazz e é o que nos motiva como músicos.

 

 

CS = Como você e o Mariano ingressaram no trabalho que o Gustavo e o Esteban iniciaram?

PP – Já conhecíamos o álbum que eles gravaram e o Gustavo estava muito motivado para experimentar o EWI. Naquela época, com o Escalandrum fizemos um tour que durou cerca de cinquenta dias. E ele praticava constantemente com seu novo instrumento. No grupo respeitamos os gostos e ideias de todos e não gostamos de forçar. Lembro que estávamos no Equador, para onde viajamos de van. Nico (Nicolás Guerschberg) é fã do som do piano acústico. Mas em uma das viagens ele comentou que gostaria de tocar teclado elétrico. Imagine a surpresa de todos nós! E pensamos que se ele fosse tocar teclado, o Gustavo poderia adicionar o EWI e o Mariano poderia tocar o baixo elétrico. E esta foi a semente da nossa abordagem ao som que finalmente se reflete em Versus.

CS = Foi um desafio integrar a base rítmica num projeto que, de certa forma, já estava consolidado sonoramente?

PP – Gosto sempre de brincar com groove. Participei de vários grupos de funk como Giusti Funk Corp, Fernández 4 ou Pájaro de fuego, grupo de Esteban. Gosto da música dos Headhunters, por exemplo. Mas estou interessado que não seja um ritmo estático, mas sim que tenha a facilidade e a liberdade que vem daquilo que não sabemos o que é, mas que todos chamamos de Groove. E é isso que fazemos na Versus. Com o Mariano nos sentimos muito confortáveis ​​com a ligação, principalmente pela liberdade que o grupo tem. Observe que o slogan é “toque, mas não ensaie”. Isto permite-nos tornar cada apresentação diferente e dá-nos uma margem de liberdade e frescura que se reflete na música que fazemos. Damos-nos a oportunidade de tocar novas músicas que nos motivam cada vez que nos apresentamos ao vivo. Você tem a sensação de estar tocando algo que nunca tocou antes.

CS – “Vou tocar isso amanhã”, como diz Johnny Parker em The Pursuer de Julio Cortázar 

PP – É assim. E a gravação do álbum aconteceu assim também . Tínhamos sido campeões mundiais e para comemorar nos reunimos três dias depois no estúdio de gravação do Esteban só para tocar durante quatro horas. E quando ouvimos o que estava gravado ficamos surpresos.

CS – Este disco representa apenas uma foto. Você já está pensando ou trabalhando no segundo?

MS –  Já temos material para começar a gravar um novo álbum. Mas também estamos trabalhando em novo material do Escalandrum. Terá um som mais elétrico, se você quiser. E nesse sentido o Esteban foi uma espécie de consultor do novo som que estamos a trabalhar.

CS – Existem sons que mudam com o tempo. Do jazz-rock que surgiu com Miles Davis, passando pela Mahavishnu Orchestra, Return to Forever ou Weather Report nos anos 70, à fusão dos anos 80, com Yellowjackets ou ao som da editora GRP ou ao smooth jazz dos anos 2000. Com que som você se identifica no Versus?

GM – É difícil identificá-lo porque estamos em constante movimento . Acho que o que fazemos não é uma mudança para ficar no mesmo lugar. Parece-me que nós, como muitos músicos de jazz neste caso, o que queremos é continuar a investigar, não só pelo simples facto de “tocar”, mas também aprofundar e investigar os limites a que cada um pode chegar. Não se pretende negar o que foi feito mas sim tentar encontrar novas formas de nos expressarmos através da música.

PP – Nosso principal objetivo é sempre tentar tocar melhor.