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A Alma e o Talento de Pedro de Alcântara

O cenário jazzístico capixaba sempre esteve presente no Clube de Jazz. Nomes como Afonso Abreu, Fábio Calazans, Wanderson Lopes, Daniel Dias, José Moreira e Salsa Brezinski, entre outros grandes músicos estiveram presentes em nossas notícias. O espaço agora é ocupado pelo pianista e compositor Pedro de Alcântara que acabou de lançar ‘Saci’, seu quarto trabalho no Festival de Jazz de Santa Teresa. Nessa entrevista ele passeia por sua obra e história.

 

Wilson Garzon – Você já nasceu sentado no piano ou a escolha demorou um pouco?
Pedro de Alcântara – Comecei um pouco tarde, aos 11 anos, no órgão eletrônico com 2 teclados, pedaleira… só aos 15 migrei para o piano.

WG – Na sua formação você passou pelo clássico ou vou enveredando pela mpb e jazz?
PA – Sempre na música popular, minha formação foi a mais eclética possível, com a professora Tania Catarina (órgão), e depois com a Délia Fisher (RJ) e com o Hilton “Gogô” Valente, já no curso de Música Popular da Unicamp.

WG – Seu primeiro trabalho, “Pedra Coração‘, ´, tem como tema central o resgate amoroso pela sua família. Como ele foi desenvolvido: como uma ideia pronta ou uma música de cada vez? Era na época que você estudava em Campinas?
PA – Exatamente. É um disco bastente sentimental para mim, pois foi sendo composto à medida que meus filhos cresciam, e tem muito dessa história na capa, nas canções, e na forma como foi concebido. Foi meu trabalho mais demorado, uns 5 anos até ficar pronto, vários studios, várias cidades…

WG – Já ‘Alma Capixaba‘ foi um trabalho de grande folego e que o projetou no cenário da Música Instrumental Brasileira. Como foi esse processo: escolha dos compositores, gravação e repercussão na mídia.
PA – ‘ALMA CAPIXABA é realmente um divisor de águas na minha carreira, pois além de ser apresentado na formação que mais gosto – piano trio – e contar com dois virtuoses e grandes amigos na cozinha (Edu Ribeiro  e Gilberto de Syllos), representa minha história ao mesmo tempo que homenageia meus mestres. É um trabalho atemporal, e creio que sempre revisitarei um ou outro tema deste disco, que considero representativo para a cultura do ES.

WG – Em ‘Onde Andará“, você retorna ao tema da infância, agora dentro do ponto de vista do professor. Ele tem uma linha pedagógica ou foi fluindo dentro da sua experiência como didata? Quanto aos músicos, nele estão presentes os melhores da cidade.
PA – Esse trabalho é fruto de quase 20 anos de atuação como professor de musicalização para crianças. Ele é um apanhado das mais de 100 canções infantis que compus neste período, e que ainda continuo compondo. Para a gravação contei com a impecável produção do Roger Bezerra, e a participação de grandes nomes da música pop de nosso estado, como Alexandre Lima (‘Cabelo na Cabeça’), Saulo Simonassi (Kika) e Fred Neri da banda ‘Macucos’ (‘Uma A Barca Chamada Arca’). As crianças adoram e cantam de cor.

WG – No Santa Jazz 2018, você lança “Saci“, com a co-participação do gaitista Gabriel Grossi. Nele, você abraça novamente os músicos locais, como Carlos Bernardo e Bruno Mangueira. Foi mais fácil de concretizá-lo que o “Alma Capixaba“?
PA – Cada trabalho traz seus desafios e nuances. Enquanto o Alma Capixaba é um disco de registro, com um caráter histórico e de homenagem, com uma formação tradicional, gravado no pomposo Theatro Carlos Gomes; o SACI representa a nova safra de compositores capixabas de música instrumental, com uma formação mais moderna, calcada na percussão e na harmônica do genial Gabriel Grossi. Ambos os discos contaram com o apoio da Secretaria de Cultura do ES, o que tornou sua realização possível.

WG – Como autor, você participa com ‘Lapataia’, ‘Pedra Coração’ e o ‘Triângulo’. Conte-nos um pouco sobre a seleção delas no repertório.
PA – Estas composições são regravações de temas importantes na minha carreira, e que apresentavam afinidade com a proposta do SACI e com a sonoridade da harmônica do Grossi. Pedra Coração dá nome ao meu primeiro disco, uma homenagem ao meu primogênito, Pedrinho de Alcântara, que também participa do CD tocando guitarra e violão. Na versão do Saci optamos por uma novidade, a harmônica MIDI do Grossi na introdução; Triângulo está na terceira versão, pois foi gravada no Pedra Coração e também no excelente Palco Iluminado do Afonso Abreu Trio, do qual faço parte há mais de 20 anos. Aliás, a música é uma homenagem ao trio, por isso o nome O Triângulo; Lapataia é o nome de um rancho no Uruguay que abriga um dos maiores e melhores festivais de jazz da América Latina, e um dos doces de leite mais gostosos do mundo. Pude participar de uma das edições e compus este tema, traduzindo num bolero um pouco do ambiente latino e musical daquele festival maravilhoso.

WG – E sobre a escolha dos músicos da banda?
PA – Esse time já atua comigo há algum tempo, com algumas variações. Destaco sem dúvida alguma nosso solista Gabriel Grossi, que com sua simplicidade e genialidade, puxou todos nós para cima, e pudemos dar nosso melhor na interpretação dos temas. A percussão de Edu Szajnbrum também teve grande importância na sonoridade geral do disco, trazendo muita brasilidade e uma sonoridade bastante intensa. Completam a cozinha os excelentes Fausto Lessa e Hugo Maciel (contrabaixo) ; Gabriel Ruy (bateria); Bruno Mangueira (violão) e Pedrinho de Alcântara (violão e guitarra). Só feras do primeiro time da música instrumental capixaba (e brasileira).

WG – Como você está projetando a divulgação e apresentações de ‘Saci‘?
PA – O disco está sendo distribuído nas principais plataformas digitais (Spotify, Deezer, AppleMusic, GooglePlay), que são a forma mais prática de se consumir música hoje em dia. E para quem ainda gosta de capa, encarte, ficha técnica… pode adquirir o CD físico diretamente na página do Facebook (pedrodealcantaraoficial). O disco foi lançado no Santa Jazz 2018, e tenho a pretensão de fazer shows de lançamento em algumas capitais: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília devem receber o SACI ainda este ano. E em janeiro de 2019 o ‘Saci’ embarca para a EUROPA, para uma tour em Portugal, França e Itália.

WG – Já que você personifica bem a ‘alma capaxiba’, tem evoluído bem a presença do jazz e da música instrumental brasileira no ES?
PA – O capixaba tem uma vocação inequívoca para o jazz, e a cena musical tem evoluído bastante. Muitos bons músicos tem surgido, e a oferta de profissionais e técnicos também aumentou e se qualificou. Novas escolas surgiram e cursos de ensino superior foram implementados. Mas há também muita dificuldade e as velhas reclamações da categoria por melhores cachês e maior oferta de espaços…  Ainda somos o patinho feio da região sudeste, mas algumas penas começam a brilhar mais…  Quem sabe um dia não acordamos cisne?