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Enrique Peña apresenta ‘Crónica de un Recuerdo’

Nesta prazeirosa busca de talentos e de nichos de boa música na America Latina temos encontrado um mundo de coisas boas e a única coisa lamentável é a falta de tempo para estar sempre onde as iniciativas se fazem presentes. Os amigos do Clube de Jazz sempre enviam suas novidades e projetos mas desta vez fomos surpreendidos por um artista ainda desconhecido para nós, que nos convidou para o lançamento de seu primeiro disco. O guitarrista colombiano Enrique Peña acaba de lançar o disco ‘Crónica de Un Recuerdo’, e decidiu compartilhar o momento conosco.

O músico Enrique Peña nasceu em Cali, e desde muito cedo já começou a se interessar por música, influenciado por sua avó, que o introduziu no folclore colombiano. Estudou guitarra clássica e migrou para Buenos Aires, onde se graduou em guitarra jazz no Conservatorio Manuel de Falla. Radicado já há mais de doze anos na Argentina o músico está integrado a cena local , ensina música na Escuela de Música Contemporanea, e traz uma força mais a esta valiosa praça de musica no nosso continente.

O disco Crónica de un Recuerdo foi gravado no ano passado e é todo composto por Peña, exceto na faixa El punto, um tema tradicional do Pacífico colombiano. A proposta é se mostrar como um disco autoral de jazz com sutis toques do folclore colombiano , o resultado é uma maravilha. É importante destacar o cuidado com que o artista colombiano tratou seu primeiro registro. Ele contou com Pablo Moser, no sax tenor, Juan Bayon, no contrabaixo e Guillermo Harriague na bateria. A produção é do próprio Enrique Peña.

 

 

As composições montam quadros, como paisagens, a tal lembrança que Peña quer nos mostrar com elegância e delicadeza, sem abdicar do improviso e das interações com os demais instrumentos.

O primeiro tema, Mangle (mangue) , desfila claramente os elementos folclóricos mencionados, com o sax contornando o contexto.
Ginebra tem introdução instigante de Bayon e a melodia condutora vem acompanhada de variações bem relaxantes, baseadas no pasillo colombiano.
No tema Siempre Llueve, Peña faz bela introdução para uma balada na qual o sax nos conta alguma historia triste , que Peña corrobora com elegante solo.
El Rio lembra logo de cara que este disco e esta formação são do mundo do jazz, com ritmos quebrados e improvisos coletivos, alem da dança rítmica do contrabaixo e da bateria.
Agua va tem ritmo constante, com sutileza e elegância do baterista Harriague, um fio condutor para melodia e solos, e provavelmente esconde mais algum elemento do folclore colombiano.
Un Año y Medio nos mostra mais uma vez uma paisagem que os ouvidos tentam reconhecer, algo que nos embala, e algo que o universo de Enrique Pena levemente revela.
III (Tres) introduz um clima de nostalgia para seguir com improvisos, variações de ritmo e dissonantes, apontando para o jazz contemporâneo.
El Punto é a única composição adaptada do folclore colombiano, mas com os atrevimentos de Peña nos arranjos, belos fraseados de Moser, o envolvimento de todos numa dança surreal , e a costura infalível de Enrique Peña num dedilhado muito elegante.
Crónica de un Recuerdo é um disco a ser descoberto a cada audição.

 

 

Lançamento

O grupo vem se preparando para o lançamento oficial do disco que acontece no dia 23 de dezembro, na casa cultural El Quetzal, localizado em Palermo. Mas tive a sorte de estar em Buenos Aires num dos encontros prévios, desta vez no Antidomingo, ponto de cultura instalado num casarão de Saavedra e que tem se dedicado a programar música diferenciada, não necessariamente jazz. Nesta apresentação eles estavam em trio, com Juan Bayon no contrabaixo e Inti Sabev no clarinete e clarinete baixo, trio que se prepara para o próximo trabalho que sairá em 2020. Então já estamos degustando uma música mesclada entre o disco novo, o material inédito, e standards do jazz.

Esta formação dá um ar bastante chegado à musica de câmara, um namoro eterno entre o jazz e a musica clássica. Já começamos com uma nova sonoridade, Inti Sabev vem com o clarinete no lugar do tenor do Moser. Peña desfila suas composições e revela uma de suas influencias quando anuncia o tema Carefull, de Jim Hall, conversa um pouco com a platéia, enfatiza o momento especial deste trabalho. Formato e repertorio bem escolhidos, execução comprometida de todos, nenhuma demonstração de virtuosismo, uma prioridade total ás composições, e ao clima relaxante do trio. Um deleite total.

Paulo Cesar – Enrique, como você decidiu enveredar pelo mundo da música?
Enrique Peña – Venho de uma família que não tem tradição musical, mas com minha avó ouvíamos muita música folclórica da Colômbia. Me interessei pelos instrumentos típicos, como o charango, a quena, e o tiple*.
(*guitarra de 12 cordas distribuídas em 4 grupos de 3 cordas, tem muita semelhança com a viola brasileira, inclusive no som e no tamanho.)

PC – Quais são suas influências ? Já mencionaste a música folclórica colombiana, mas tem alguma influencia internacional?
EP – Onde eu morava não havia uma escola de jazz, então eu comecei estudando o violão clássico, e ate hoje eu escuto e gosto muto da música clássica. Então comecei a tocar a guitarra elétrica, e ai descobri o jazz, a improvisação. Minha influência na guitarra é Jim Hall, não tem como um guitarrista não estar ligado a esta linha de jazz, mas abrindo o leque temos Charlie Parker, Miles, e agora me lembro bem de Lennie Tristano* e toda sua escola, como Lee Konitz, Warne Marsh…
(*o pianista Leonard Tristano foi um dos primeiros professores de improviso em New York na década de 40 e 50 e um dos pilares da ponte entre o bebop e o avantgarde, musica não comercial)

PC – Sabemos que agora é hora da divulgação do disco Crónica de un Recuerdo mas tem algum projeto próximo, um tour…
EP – Bem, estamos trabalhando neste primeiro disco mas já temos o esboço de temas e as ideias para o próximo trabalho, que será um trio, com guitarra, contrabaixo, e clarinete/e clarinete baixo, com Bayon e Inti Sabev. Este projeto já está encaminhado para 2020, e pensamos em levar esta música para apresentar na Colômbia, um motivo de grande felicidade!

Nota: Queremos agradecer a acolhida do staff do Antidomingo, e novamente anunciar o lançamento do disco Crónica de un Recuerdo no dia 21 de dezembro, no El Quetzal, em Palermo. Esperamos que em algum momento possamos ter esta musica tão especial aqui no Brasil!