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Fred Hersch e Anat Cohen, um duo primoroso

Luiz Orlando Carneiro, Jornal do Brasil, 24/02/2018

 

Anat Cohen tem aparecido com frequência nesta coluna. Em primeiro lugar, por ser a mais brilhante clarinetista da cena jazzística – independentemente de gênero – como atestam, desde 2010, as eleições anuais dos críticos do mundo todo promovidas pela revista Downbeat. Além disso, tem um temperamento irrequieto que reflete a sua criatividade sempre em ebulição.

No ano passado (21/10), comentamos aqui o álbum Happy Song (Anzic Records), no qual ela comanda um tenteto, em colaboração com o arranjador Oded Lev-Ari – seu amigo e conterrâneo, que também emigrou de Israel para os Estados Unidos, onde se formou no New England Conservatory. Em 2016 (26/11) recomendamos o CD Outra Coisa/The Music of Moacir Santos – um duo com o violonista (sete cordas) Marcello Gonçalves, e que foi um dos cinco indicados para o último Grammy na categoria “Best Latin Jazz album”.

Anat volta agora às lojas virtuais (sempre no seu selo Anzic) em Live in Healdsburg, registro ao vivo de uma apresentação também em duo. Só que, desta feita, com o eminente pianista Fred Hersch, em junho de 2016, no festival de jazz daquela pequena cidade da Califórnia.

Fred Hersch – que toca no Village Vanguard pelo menos duas vezes por ano, e onde gravou ao vivo três dos principais itens de sua discografia – dispensa novos comentários. Mas vale reproduzir o que dele disse o também notável Jason Moran, 20 anos mais moço: “Fred ao piano é como LeBron James na quadra de basquete. Ele é perfeição!”.

A propósito deste novo disco, Hersch diz que gosta muito de gravações ao vivo, nas quais não se está preso “numa cabine com headphones”, e “a gente nunca sabe quando a luz vai piscar”. E acrescenta: “Se eu fosse tão rico como Keith Jarrett gravaria todas as minhas performances ao vivo. Quando menos se espera, temos uma daquelas noites incríveis”.

Em Live in Healdsburg, o sofisticado duo interpreta, em interação constante, oito peças, das quais três composições de Hersch e uma de Cohen. Respectivamente: A lark (8m20), um dos temas preferidos do pianista; Child’s song (7m20); Lee’s dream (5m20); e The purple piece (8m25), que a clarinetista lançou no CD Poetica (Anzic, 2007).

Nas demais faixas, os pontos de partida e de chegada são cultuadas relíquias do repertório jazzístico: Mood indigo (5m15), de Duke Ellington; Isfahan (8m05), de Billy Strayhorn, o alter ego de Ellington; Jitterbug waltz (8m15), de Fats Waller, sinônimo do stride piano na Harlem Renaissance da década de 1930; The peacocks (10m25), do pianista Jimmy Rowles (1918-1996), que foi a faixa-título de um LP de 1975 do saxofonista Stan Getz.