Argentina

O Super baterista Oscar Giunta: Apaláp!

Quando se pergunta sobre bateria no jazz argentino, o primeiro nome que vem à cabeça é o de Oscar Giunta. Músico que teve uma carreira precoce e que se consagrou no Quinteto Urbano, só agora lança seu primeiro trabalho ‘Apaláp!’. Nesse entrevista, ele nos conta sobre a formação do trio, processo de gravação, repertório e divulgação do seu álbum. E também fala sobre sua carreira, ideias e conceitos sobre a música e de suas incursões no território brasileiro.

Wilson Garzon – Depois de participar de grupos importantes dentro da cena jazzística argentina, porque só agora lança seu primeiro trabalho solo?
Oscar Giunta – É uma pergunta interessante, porque pode ter várias respostas e todas elas vão ficar bem. Há normalmente uma dualidade na situação daqueles músicos que têm a alegria e a bênção de serem permanentemente chamados, durante muitos anos, a participar em vários projetos musicais. Como isso significa uma grande apreciação da sua arte, é muito comum sentir-se protegido nessa situação, que pode levá-lo como a maré do mar a diferentes lugares. Essa vertigem é linda e lisonjeira.

Nesse contexto, eu realmente tive que considerar, fazendo uma parada forçada a tudo isso, para finalmente dedicar uma energia, tempo e amor ao que eu tinha e tenho a dizer como artista (não apenas como músico). Com isso, falo não só do meu trabalho como baterista, mas também do meu trabalho como compositor, líder de banda, conceituador de uma história musical e produtor artístico e executivo.

Ao dar este grande passo, descobri algo com muita felicidade e orgulho: havia uma quantidade incrível de pessoas esperando por meu trabalho solo e minha música e isso foi imediatamente perceptível para levar meu trio às rotas de toda a Argentina e vários países ao redor do planeta. Eu sempre fui um “Animal de Palco” e sempre fui um forte defensor da situação da música “ao vivo” e que as pessoas assistissem a concertos e vivessem e batessem a realidade da música, que é quando a música acontece e é formulada.

Nesta era de “duplo clique” Enter e pequenos botões, este é mesmo um evento romântico e revolucionário. Eu gosto dessa ideia. A verdade também é que eu nunca senti necessidade de ser um “artista” porque eu tinha gravado um álbum. Este é o narcisismo de muitos, mas nunca me tirou o sono. Com “Apaláp!”, o meu novo álbum, decidi dar um passo em frente. Da mesma forma, tenho mais de 100 álbuns gravados como co-líder ou sideman ou em várias colaborações com músicos de várias latitudes.

 

WG – Quando foi criado o Oscar Giunta Supertrío? Qual foi o conceito do Trío? Quantas formações houveram até chegar em Jacinto e Romero?
OG – O meu trio existe desde dezembro de 2012. Desde o início, eu tinha claro que este grupo teria sua razão de ser no fato de um contato permanente com o público, para levar esta música a todos os cantos das cidades e regiões do meu país e assim poder promover um encontro sindical e um ritual musical em cada grande cidade e em cada pequeno bairro ou região do meu país. Isto é algo que herdei sobretudo do espírito “Rocker“, de várias bandas que integrei na minha juventude, e está extremamente longe daquela coisa de “elite” que se pretende claramente estabelecer no jazz pseudo-intelectual.

Era algo que eu não podia fazer antes com muitos outros grupos que eu integrava, mas aqui eu tenho todo o poder de decisão a este respeito e eu trabalhei muito duro para alcançar esse objetivo. O tempo provou que eu tinha razão. Foi assim, e os resultados estão lá para todos verem. Não há nada mais bonito do que sair para as estradas e conhecer pessoas. Ver os seus rostos durante os concertos ao vivo, e toda a energia a voltar do público para o palco, é algo formidável, que nada pode jamais substituir.

O conceito do “Oscar Giunta Supertrio!” é baseado principalmente na minha ideia de que todo músico pode tocar o que quiser nas composições, e que ele pode se expandir confortavelmente na música. É claro que isto requer um grande conhecimento musical e humano e uma grande confiança. Por outro lado, este é um trio de “Música“, e com isto quero dizer que não existem restrições estilísticas ou de gênero. A música do meu trio pode deixar de ser algo puramente jazzístico baseado na mais ortodoxa das tradições, para tornar-se mais rock, ou câmara, ou afro-latina, ou outras formas populares, e continuar sendo um grupo de música jazz, entendendo que o jazz é uma forma de tratar a música e não apenas um ritmo.

Assim como existe o jazz afro-cubano ou o jazz brasileiro, também existe o jazz argentino, do qual me sinto orgulhoso e feliz por ter sido um precursor disso, com aquele fabuloso grupo que formamos há mais de duas décadas com o trompetista Juan Cruz de Urquiza, o “Quinteto Urbano“, grupo que fundou na Argentina o conceito de verdadeira “banda de jazz”. A banda é uma mistura de jazz, tango e música folclórica da Argentina e do Rio de la Plata. Hoje, o “Oscar Giunta Supertrio!” continua essa linhagem.

O Oscar Giunta Supertrio! no início, tinha em suas fileiras, o contrabaixista Arturo Puertas, um grande músico e também um grande amigo pelo qual sinto uma grande apreço pessoal. Arturo foi uma parte vital deste projeto por muito tempo, até que ele partiu por razões pessoais para se dedicar a outros projetos. Desde então, o contrabaixista do meu trio é Flavio Romero, e sem dúvida, a sua inclusão no trio não só representou uma renovação sonora mas também também lhe deu a possibilidade de alargar ainda mais a gama estilística.

Conheci Flávio compartilhando alguns projetos de outros músicos. Ele me chamou minha atenção de imediato, porque é um músico com sólida formação em música clássica, jazz, tango e world music (ele também é um grande baixista elétrico). Pouco antes de chamá-lo para o meu trio, fui convidado para fazer uma turnê por toda a Ucrânia com músicos daquele país, e me pediram para sugerir um baixista para aquela turnê, que atendesse a certas condições, como tocar jazz, improvisação, boa leitura musical, tocar tango e música clássica. Pensei imediatamente no Flavio, porque ele preenchia todas estas condições. Foi uma turnê intensa do outro lado do planeta durante um mês inteiro que, sem dúvida, fortaleceu o vínculo musical e humano que, sem dúvida, desencadeou a sua inclusão final no meu trio. Flávio é também o líder do seu próprio grupo com o qual gravou dois álbuns fabulosos como líder, compositor e arranjador. Não deixes de os procurar.

Com Hernan Jacinto, o pianista do meu trio, a história é mais longa. Eu estava fazendo shows no Uruguai no final dos anos 90, com músicos experientes (e até mesmo, eles costumavam cair lá, músicos como Danilo Perez e outros) e eram noites intensas de jazz e música em geral. Hernán era então um jovem que vinha, noite após noite, para ouvir estes concertos durante horas. Alguém me tinha dito que ele tocava piano e que tocava um pouco de jazz. Então, uma noite, eu insisti que ele subisse ao palco e para que tocássemos música juntos. Imediatamente percebi que ele era um artista em formação, com muitas habilidades e um grande talento. Não estava enganado: hoje ele é um dos grandes pianistas da Argentina,  e também é um líder em seus projetos e tem um par de discos muito bons em seu crédito. Desde então, temos partilhado vários projetos e ele já tocou em vários grupos com o meu nome (trios, quartetos e quintetos). Já é um companheiro musical de muitos anos. Uma alegria!

Sinto-me muito feliz e abençoado por tê-los para o meu grupo. Partilho com eles todo um background de ter tocado não só muito jazz, mas também R & B, Funk, Motown, Clássico, Tango, Folclore, Brasileiro, Afro-Cubano e World Music. Acho que todos esses antecedentes podem ser ouvidos no meu grupo. E eu gosto disso.

 

WG – Porque a escolha de gravar em NY? As sessões foram tranqüilas? A mixagem também foi realizada em NY?
OG – Minha escolha não foi gravar em NYC, mas sim de gravar meu álbum tendo Luis Bacqué como engenheiro de gravação, mixagem e masterização. Trabalhei com Luis em inúmeras ocasiões em Buenos Aires, quando ele estava trabalhando em um estúdio aqui, onde gravei inúmeros álbuns de jazz, sempre tendo Luis como engenheiro de gravação. A última sessão de gravação do Luis na Argentina antes de viajar para os EUA foi uma sessão que eu participei (acho que ele estava viajando no dia seguinte) e ainda me lembro das suas palavras daquele dia: “Algum dia vou gravar um álbum seu no meu próprio estúdio em NYC. Vamos manter contato” (isso aconteceu há nove anos…ou talvez dez).

De volta da vida, em 2018 recebo um convite para viajar com meu trio para os EUA, para a área de Wisconsin, Chicago e Nova York.Pensei imediatamente que poderia ser uma grande oportunidade para cumprir aquelas palavras de Luis há dez anos, e escrevi para ele. Quase por magia, os únicos dois dias que tive como “days off”… As datas eram livres, por isso viajávamos do Midwest num voo para Nova Iorque para entrar no “Bacque Recording Studios” (www.bacquerecording.com) e fazer este álbum que pode apreciar hoje (“Apaláp!“). Isto foi em Abril de 2019. A mixagem e masterização do álbum também foi feita por Luis Bacque em seu estúdio, em outubro de 2019. Finalmente, o álbum foi lançado em formato físico no dia 13 de janeiro de 2020 (meu aniversário!) e em formato digital para todas as plataformas mais importantes, no dia 31 de janeiro de 2020.O lançamento do álbum em formato físico e digital, é de “Club del Disco” (www.clubdeldisco.com)

Nesse momento, gostaria de destacar o autor das fotografias de capa e contracapa do álbum, o grande Eduardo Cesario (www.rockimagery.com e www.criaturacreativa.com), que também fez a arte e o design gráfico de todo o álbum: foi um  grande luxo e privilégio poder contar com ele na edição deste álbum.

WG – Das sete que compõem o repertório, quatro músicas são de sua autoria. Conte-nos um pouco sobre o processo de criação de cada uma delas.
OG – Das quatro composições que compõem o meu álbum “Apaláp!“, há duas que fazem parte do repertório regular há já algum tempo (“E.C.T” e “Aiá”). As outras duas (“San Andres” e sobretudo “Apaláp!”) são peças mais recentes da minha música autoral, e na verdade, “Apaláp!” foi uma música que mal tinha o principal leitmotiv harmônico e melódico e algumas ideias para as partes B e C da música, mas que tomou a sua forma final antes de ser gravada no estúdio de gravação.

Foi uma bela situação, porque eu estava chegando à gravação com um repertório que já vinha tocando há muito tempo e sendo muito bem recebido e a inclusão desta música significou um ar fresco, renovador e uma surpresa que é sempre bem-vinda pelo frescor e energia vital da música. Todas estas minhas composições, são o produto de um momento chave na minha vida, por várias razões, algumas felizes e outras não tão felizes (embora finalmente todas sejam felizes, porque a música tem aquele belo poder de polarizar as energias).

A música é como as plantas: elas absorvem monóxido de carbono e emanam oxigênio para que possamos viver melhor.
Basicamente, essas músicas são muito relacionadas com a minha alma e o meu coração para toda a vida e essa foi a razão principal para mim, para fazê-las parte do repertório e do álbum.

 

 

WG – As outras três já faziam parte do repertório do Trio ou foram escolhidas para esse CD?
OG – Quanto às outras canções que estão incluídas no álbum, “Cabrera’s Blues” é talvez a música mais “Straigh Ahead Jazz” do álbum e é um blues jazzistico, cuja melodia pertence a Hernán Jacinto, pianista do meu trio. Ela já faz parte dos concertos ao vivo do meu trio há muito tempo, e sempre me divirto muito quando a toco.

Sus ojos se cerraron” é um clássico do Tango, composição da dupla “Carlos Gardel (ícone do tango por excelência) e Alfredo Lepera (que também é um ícone compositor do tango, e era de nacionalidade brasileira!) Finalmente, a inclusão de “Black Hole Sun” pela banda de mega rock dos anos 90, “Soundgarden“, também está altamente relacionada (embora não pareça) com a inclusão da peça de tango.

Você pode pensar que estou dizendo coisas malucas, mas a verdade é que sempre foi minha ideia, desde o início do meu trio, que minha banda também serviria como plataforma para acabar com esses mitos e preconceitos sobre gêneros e estilos, e mostrar que em toda a música do mundo há belas e incríveis melodias, além de nacionalidades, etnias, credos, estilos e preconceitos.

Acredito que a única coisa que não me perdoo como músico, é o fato de não estar permanentemente à procura desse grau de beleza, de sentir que se está realmente vivo, em estado de graça e na melhor situação possível, quando se toca música e a música está a acontecer. Esse é um dos momentos mais emocionantes e vibrantes que a vida me dá, e eu não me permitiria arruinar isso por causa do estilo ou gênero. Lá eu fico livre como um pássaro. Acredito que todos nós, que estamos imersos em algum ramo da arte, estamos por trás deste sentimento e momento sublime.

WG – Como está sendo a divulgação de ‘Apaláp!‘? Que eventos estão sendo programados?
OG – Bem, agora vem a apresentação oficial do álbum no Teatro Colón de Buenos Aires, que como todos sabem, é considerado um dos mais prestigiados coliseu com a melhor acústica do mundo por muitos anos. Este concerto terá lugar no sábado, 14 de Março de 2020. Acho que é uma bela maneira de coroar tudo o que tem sido o processo de trabalho nesse álbum e poder dar ao público algo maravilhoso, depois de tantas demonstrações de carinho, admiração e amor de todos estes anos. Será uma grande noite, uma grande festa para todos! Será uma grande noite para a música argentina. Já começamos a fazer apresentações do álbum no interior da Argentina, tocando em várias grandes cidades e províncias, e também acabamos de voltar com o meu trio de uma turnê de muito sucesso em várias cidades e regiões do Chile.

Depois do grande concerto do Colón, começa uma extensa excursão de apresentação oficial por toda a Argentina. Em  junho e julho chego com o meu trio à Europa, cujo primeiro concerto será no “Hildener Jazztage” na Alemanha, encabeçando o cartaz ao lado da WDR Big Band (talvez, a melhor e maior Big Band do Mundo na atualidade). Em seguida, o trio fará um tour pela Alemanha, Suíça, Holanda, Itália, França, Espanha, Suécia, Noruega, Inglaterra e, na sequência, a travessia para a Europa Oriental e a visita a várias cidades na Ucrânia e na Rússia.

Apaláp!” acaba de ser lançado no dia 25 de janeiro no Japão, e uma quantidade considerável de álbuns já foram vendidos em um tempo muito curto, e mais foram encomendados de lá, então eu prevejo que o Japão será outro destino em nossa turnê em 2020 ou 2021.

 

 

WG – Para os jazzistas brasileiros, que trabalhos seus você destacaria para melhor conhecerem a sua arte e técnica?
OG – Claro que, antes de mais nada, convido os brasileiros de todo o coração a ouvirem o meu novo álbum. “Oscar Giunta Supertrio! Apaláp!“, que pode ser ouvido no Spotify, e em todas as plataformas digitais mais importantes do mundo.  Caso queirem adquirir o álbum físico, façam o contato com www.clubdeldisco.com, que é um selo argentino com alcance mundial. Fico muito feliz em poder alcançar os corações de todos os amantes da música no Brasil e no mundo com este novo álbum!

Também sugiro e recomendo os álbuns que gravei com um grupo que tivemos no final da década de 90 e início de 2000: “Quinteto Urbano“, este grupo foi formado pelo grande trompetista argentino Juan Cruz de Urquiza, junto com o saxofonista Rodrigo Dominguéz, o contrabaixista Guillermo Delgado e o pianista Diego Schissi.

O Quinteto criou uma música de qualidade, com muita elaboração e grande recepção por parte do público. Era uma verdadeira “banda de jazz”. É foi pioneira na fusão de jazz, tango, música afro-latina e folclore argentino.Há três álbuns no Spotify e Youtube “Quinteto Urbano – Jazz Contemporaneo Argentino” “Quinteto Urbano – Jazz Contemporaneo Argentino II – Estudio + Vivo” e “En Subida“.

WG – Você costuma se apresentar no Brasil? Pretende vir aqui para divulgar ‘Apaláp‘?
OG – Eu estive algumas vezes no Brasil, especialmente em São Paulo e também em Recife. Realizei algumas turnês tocando com músicos de São Paulo em lugares como “Jazz Nos Fundos”, “Bourbon Street” “Ao vivo” (não existe mais) e também fiz algumas apresentações em “Drum Clinics” e “Masterclasses” para a marca de pratos “Bosphorus Cymbals” (marca turca, com representação no Brasil, e da qual sou endorsee internacional desde 2009). Eu realizei esses shows educacionais na Escola Souza Lima de Educação Musical e também em algumas salas de São Paulo. Eu também toquei em Recife, no Teatro Santa Isabel, durante um festival de jazz muito bom de lá, onde eu pude conhecer um guitarrista muito interessante chamado Wallace Seixas.

Tenho bons amigos e ótimos músicos em São Paulo, como Ramon Montagner, Edu Ribeiro, Debora Gurgel, Dani Gurgel, Thiago Rabello, Thiago Alvez, Agenor De Lorenzi, Cassio Ferreira, Marcelo Coelho, Sizao Machado,Daniel D’Alcântara, Rogerio Botter Maio, Marinho Boffa, Conrado Paulino, Bruno Migotto, Sydney Ferraz, Fabio Cadore e vários outros grandes músicos de lá. Gostaria de mencionar Harvey Winapel, um grande saxofonista e clarinetista dos EUA que mora no Rio e com quem ele toca aqui em Buenos Aires.

Hoje tenho a oportunidade de voltar ao Brasil com meu próprio trio de Buenos Aires, Oscar Giunta Supertrio! e para algo ainda maior, que é a apresentação oficial do meu álbum e do meu grupo lá. Há algumas coisas a serem feitas em breve com a rede do SESC e também com “Blue Note” no Rio de Janeiro e alguns festivais importantes. Estou ansioso para voltar ao Brasil para compartilhar tudo isso com todos vocês! Será uma grande alegria para mim! Estou ansioso por esse momento!

 

OSCAR GIUNTA

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Apaláp! – Oscar Giunta Supertrío! feat. Hernán Jacinto & Flavio Romero