Entrevistas

O Universo Musical de Fábio Calazans

Para sim, sempre é uma honra divulgar o jazz capixaba. Quanto mais quando é um amigo de longa data, como é o caso do violonista e guitarrista Fábio Calazans. Nesse entrevista, ele nos conta sobre a sua formação, produção artística, didática e sobre o cenário do jazz no Espírito Santo. 

Wilson Garzon – Você já nasceu dentro de um berço musical e/ou quando se decidiu pelo violão/guitarra?
Fábio Calazans – Wilson, primeiro quero agradecer o convite e a oportunidade de apresentar para seus leitores, um pouco de minha história musical. Aprendi a gostar do samba canção com meu pai, a bossa nova com minha mãe, o rock com minhas irmãs e seus amigos, enfim tudo chegava dentro de casa, coisa que, acredito, era comum para as famílias até meados da década de 1980.

Meu avô tocava diversos instrumentos muito bem, diga-se de passagem, mas nunca ganhou a vida como músico. Sempre tivemos um piano dentro de casa, tocado por minha mãe. Descobri o violão, também em casa, por influência de minha irmã, que fazia aulas em casa, eu ficava no canto prestando atenção, daí fui em frente. A guitarra foi influência do Rock nos anos oitenta, mas, descobri o jazz ao mesmo tempo, então, nunca fui muito bom com as distorções.

WG – A sua escolha pela UniRio se deve à sua opção pela música popular e não clássica?
FC – Um pouco, é que na verdade, eu já tinha iniciado uma história no Rio de Janeiro. Quando fiz o vestibular, tentei no mesmo ano a UniRio e Unicamp, uma das etapas do vestibular da Unicamp coincidiu com o vestibular da UniRio, então decidi ficar no Rio. Essa coisa de ter optado pela música popular foi um caminho natural, pela minha história familiar inclusive. Mas, devia ter dado uma maior importância aos estudos de violão no início, é fundamental para tocar bem tanto o violão, quanto a guitarra, coisa que fui fazer já tendo iniciado minha vida profissional.

WG – O seu primeiro cd, “Faces“, conta com as presenças de feras como Mike Stern, Jorjão Carvalho e Widor Santiago, entre outros. Sorte de principiante? O repertório era baseado em outros autores ou já tinha obras autorais?
FC – Com certeza, foi uma tremenda sorte! Estava me formando e surgiu a oportunidade de gravar. Contei com a generosidade de diversos amigos, principalmente o Roberto Stepheson, músico fantástico e um grande parceiro, que “comprou a briga” de me ajudar na produção. O disco foi baseado em minhas composições. Teve também “Baião bem Temperado” de Roberto Stepheson e “Quem Sabe”, minha, do Stepheson e Jorjão.

WG – Seu próximo trabalho, “Outro Dia“, já é totalmente autoral. As músicas foram escritas para esse projeto ou resumem a sua trajetória como autor? E a banda, como foi escolhida? Aqui, as presenças vips de Cristóvão Bastos e Jorjão Carvalho.
FC – Este disco, me proporcionou experiências sensacionais. Desde a produção dos arranjos, onde, em oposição ao disco Faces, busquei uma unidade sonora, até a participação do Cristóvão Bastos. Tinha escrito os arranjos para acordeom e quando fui gravar, Chico Chagas, que era o cara para fazer essa gravação (já havia gravado em FACES), estava fora do Brasil.

Então Stepheson, mais uma vez, produtor do disco, propôs gravarmos piano e violoncelo, para substituir a sanfona. Jorjão, amigo que iria gravar os baixos, sugeriu o Cristóvão e Stepheson chamou o Ocelo Mendonça e assim foi. Tive ainda a sorte de contar com o Carlos César na bateria e percussão e o Stepheson fez as flautas e saxofones. Gosto muito desse disco, me levou a fazer shows em algumas cidades brasileiras, lancei esse disco em BH fazendo o Circular Brasil, projeto muito bacana idealizado e realizado pelo Marcelo Guima. Fiz shows pelo interior do ES e nos USA (Kentucky).

WG – Nove anos depois, em 2016, você lança “Orbe“. O conceito aqui foi criar obras autorais dentro de um cenário mais ‘universal’ da música brasileira?
FC – Exatamente, nesse disco, com produção do Sérgio Benevenuto, buscamos essa sonoridade mais abrangente. Usamos guitarras com efeitos e tal, já havia feito algo semelhante no primeiro disco, porém em Orbe resolvi assumir essa estética, como uma unidade. O Sérgio é o cara que saca tudo de tudo, daí a escolha para produzir este trabalho. Fiz um cursinho intensivo de produção musical nessa gravação!

WG – Conte-nos um pouco sobre o processo de gravação (tempo de estúdio, arranjos e mixagem). A banda já estava formada?
FC – Nos reunimos semanalmente durante 6 ou 7 meses enquanto preparava as composições. O método adotado por Benevenuto foi muito legal, pegamos diversas anotações, pequenos trechos musicais, composições que eu costumo deixar guardadas e construímos todas as músicas. Tive uma parceria com Paulo Sodré, amigo contrabaixista, e a última música é um choro maxixe, para violão solo, do Sérgio.

Decidimos por uma formação com violão, guitarra, teclados, baixo elétrico e percussão. Fiz um guia de violão, em meu estúdio caseiro, que serviu para Edu Szajnbrum pensar nas percussões antes de gravar valendo. Os teclados, gravados pelo Roger Bezerra, foram gravados no estúdio do Sérgio e depois encontramos os timbres já no Audiolume, estúdio aonde fizemos as gravações de percussão, violão/guitarra, baixo e também a mixagem e masterização. Quem fez o baixo e comandou a técnica no estúdio foi o Ezio Filho.

WG – Gostaria de saber se os nomes ousados dos títulos das músicas (O estranho discurso de Amilcar, Poesia no varal, Mistério do sonho que voava…) tem a ver com os estilos musicais, fatos ocorridos ou veia poética?
FC – Como não escrevo letras, muitas vezes, os nomes representam momentos, situações vividas, por exemplo, a música “Estranho Discurso de Amílcar”, ficou com uma sonoridade bem divertida, sugere um pato, chamado Amílcar, fazendo um discurso caloroso. Em “Mistério do Sonho que Voava”, contei ao Sérgio que durante uma certa época em minha vida, quando iniciei essa composição, eu sonhava que estava planando pela cidade, daí o nome. “Em Poesia no Varal”, fiz em homenagem ao evento de poesia que ocorria no balneário de Manguinhos, chamado Varal de Poesia. Desse modo, fomos nomeando todas…

WG – Como foi a divulgação e a repercussão crítica de “Orbe”?
FC – Este disco teve indicação para o 24o prêmio da música brasileira, o que, para mim, já foi um grande passo! Depois circulei com o show de divulgação pelo Espírito Santo. Fui convidado para tocar na Itália e França, então tive que adaptar os arranjos para trio e incluir outras músicas. Tocamos em Montescaglioso, sul da Itália, em um evento chamado Brasilicata Tour, um intercâmbio Brasil/Itália. Na França estivemos em Aix-En-Provence, no festival Espírito Provence. Este disco ainda tem muito para andar. É um show vigoroso e muito gostoso de tocar!

WG – Que novos projetos estão engatilhados? Novo site? Livro de música?
FC – Também sou professor na Faculdade de Música do Espírito Santo, onde leciono guitarra popular, harmonia e prática de conjunto. Em 2015 lancei o livro Acordes na Guitarra, Suas Escalas e Encadeamentos. O tema deste livro virou uma série de vídeos, que serão lançados em breve, resultado de um projeto de mestrado, na UniRio, que estou em vias de concluir.

Convido a todos para visitarem meu site, fabiocalazans.com.br que estou, aos poucos, inserindo minhas coisas lá.  Tenho um Instagram também: https://www.instagram.com/fpcalazans/

WG – Como você vê o atual cenário da música instrumental capixaba?
FC – No Espírito Santo ocorrem vários festivais de música. Tem o Festival Internacional de Jazz e Bossa de Santa Teresa, O festival de Jazz e Blues de Vila Velha, festival de Guaçuí, de Pedra Azul. Em Vitória tem alguns eventos bacanas como o Jazz na Curva, toda terça-feira, na beira da praia, com um lindo visual, tem o Frita Jazz. São eventos que incentivam e motivam os músicos da cidade. Gostaria muito de ver um festival Internacional em Vitória! Anual, com estrutura grande, workshops, coisa que movimentasse a cidade de verdade, criando um forte intercâmbio dos músicos locais com o mundo!

Meu amigo Wilson, parabéns pelo seu amor pela música! Muito obrigado, grande abraço!