‘Estar ao Redor’ de Paulo Francisco Paes

Wilson Garzon outubro 14, 2021outubro 15, 2021 0 Comments

Conheço Paulo Francisco há muito tempo e desde cedo acompanho a sua carreira como músico. Não só por ser meu primo, mas principalmente pelo seu enorme talento, tanto como pianista quanto como compositor. Primeiro lançou em 2013 ‘Chão de Nuvens’ onde ele faz a transição entre o clássico e o popular com muita criatividade. Agora, em 2021, Paulo Francisco abriu uma janela definitiva para a música popular brasileira, lançando ‘Estar ao Redor’, um disco com que ele conta com as marcantes presenças das cantoras Luisa Lacerda e Ilessi. Nessa entrevista exclusiva para o site Clube de Jazz, Paulo nos conta como foi a sua formação e sua trajetória musical, além de nos apresentar como foi todo o processo de criação e gravação desse disco, que está disponível nas redes.

Wilson Garzon – Como surgiu a escolha pelo piano: veio do berço? E a opção pela música clássica? Que músicos/compositores foram determinantes na sua formação?
Paulo Francisco Paes – A minha relação com o piano começou desde cedo vendo minha tia Maria Haydée tocar Chopin e meu tio Ricardo Camargos tocar Pixinguinha. Foi então com 12 anos que eu disse ao meu pai que queria estudar piano e fui logo apaixonando-me pelo instrumento. Aos poucos, fui conhecendo o enorme repertório dos compositores para piano solo. Chopin, Villa Lobos e Rachmaninoff sempre foram meus prediletos; acho que a influência deles sobre mim será sempre gigante!

WG – Pelo fato de seu pai, Paulo Thiago, ter sido cineasta, acabou te abrindo a oportunidade para compor trilhas para filmes. Como foi ou está sendo em termos criativos essa experiência profissional?
PFP – A minha paixão pelo cinema também foi algo da juventude, meu pai me mostrou todos os grandes clássicos do cinema, Fellini, Visconti, Kubrick etc… Como músico, sempre prestei atenção nas trilhas sonoras. Fui logo conhecendo a obra dos grandes trilheiros da história do cinema como Nino Rota, Ennio Morricone, Bernard Herrmann etc… Desde que comecei a compor, fui aos poucos inclinando-me também para as trilhas dos filmes do meu pai e do meu irmão (Pedro Antônio). Acho que foi um processo natural, pois minha família é toda do cinema.

WG – Em 2013, você lança em formatos de áudio e vídeo, o seu primeiro trabalho, Chão de Nuvens. São temas com fortes doses de lirismo onde você faz uma ponte entre o clássico e a música popular, com a presença de Jobim no repertório. É por aí? Teve boa repercussão crítica?
PFP – O meu primeiro disco, Chão de Nuvens, foi um pouco uma mistura de todas as referências musicais que eu tinha na época. Realmente, uma mistura entre o clássico e o popular, e também algo do jazz, que eu adoro. Hoje, analisando o álbum vejo que muitas faixas do disco são na verdade canções, mas que não tinham letra. A repercussão foi bacana, sobretudo porque tive a participação de grandes músicos como Leo Gandelman e Paulo Sérgio Santos no disco.

WG – Num segundo momento, você entrou na vertente das canções. Mas antes, precisava de um letrista. Como se deu seu encontro com Gustavo Vilela? Como está sendo o processo de criação: a letra vem primeiro ou a composição?
PFP – O mais curioso sobre o meu trabalho como cancionista é que muitas das melodias dessas canções foram compostas em 2011, 2012 e 2013, mas não tinham letra. Eu era muito exigente comigo para escrever letras, e após algumas tentativas minhas e de amigos, desisti. Apenas uma canção dessa época teve letra de um amigo, Quinta Estação, do Guilherme Figueira.

Essas melodias ficaram sem letra até 2017 , quando conheci o Gustavo Vilela através de um amigo, e ele escreveu uma primeira letra que eu adorei. Foi aí o início da nossa parceria que se solidificou com o tempo. Na sequência, vieram várias outras letras do Gustavo. Eu acabei entusiasmando-me e acabei também escrevendo algumas letras. No EP Estar ao Redor fiz a letra de duas das oito canções, Dias Assim e Fora do Tempo. Em relação ao processo de criação, o trabalho sempre foi assim: eu mando a melodia pra ele e ele escreve a letra. A exceção é a faixa 5 “Catarse”, que Gustavo já tinha escrito os versos e eu, musiquei depois.

WG – Conte um pouco sobre cada uma de suas composições que estão no EP Estar ao Redor.

PFP – Cada canção do disco tem uma peculiaridade:

a primeira, Fora do Tempo, foi uma das primeiras melodias que compus, lá por volta de 2010. Ela ficou anos apenas como uma melodia quando eu decidi terminar um esboço de letra pra ela em 2018, já no embalo da parceria com o Gustavo Vilela.

A segunda canção Chão de Sol, eu entreguei a melodia pro Gustavo que logo teve a ideia de fazer uma letra inspirada em Graciliano Ramos. A letra tem muitas referências ao escritor.

A terceira faixa do disco é Baião de Nós, que compus em 2020 e Gustavo fez a letra logo em seguida. Esse baião é um pouco da síntese das minhas influências musicais, pelo fato de eu ter escutado e frequentado muitas rodas de forró e baião no Rio de Janeiro. Sempre adorei a levada do baião, que está presente numa peça para piano solo chamada “Valente”, que faz parte do repertório de Chão de Nuvens, meu primeiro disco instrumental. A letra do Gustavo é uma espécie de crônica da vida cotidiana do brasileiro; eu particularmente, adoro essa letra. Uma outra curiosidade dessa faixa é que foi o início da parceria com a cantora Luísa Lacerda. Foi a primeira música minha que ela escutou e quis gravar; fiquei muito feliz.

A faixa 4 Estar ao Redor, que dá nome ao disco, foi a única melodia do disco que compus fora do piano. A melodia veio na minha cabeça durante a pandemia e o Gustavo fez a letra rápido. Foi uma canção que ficou pronta rapidamente.

A faixa 5 Catarse, tem uma peculiaridade: pois foi a única faixa do disco que o Gustavo já tinha a letra pronta (eu musiquei depois). Acredito que seja a mais popular do disco. A música parece que foi feita para a Ilessi cantar; adoro o timbre dela na gravação.

A faixa 6 Dias Assim, junto com a primeira, são as duas canções do disco que eu fiz a letra e a música. A melodia, compus em 2013, durante um período difícil. Acho que a melodia carrega essa melancolia da fase que eu me encontrava. Decidi colocar letra nela no embalo da parceira com o Gustavo. A canção ficou pronta em 2019. Talvez seja a que eu mais me identifique musicalmente, pelas influências eruditas que tenho, por gostar dessas linhas melódicas longas.

A faixa 7 Flor de Outono, seguiu o mesmo padrão da parceria, eu compus a melodia no piano e dei para o Gustavo fazer a letra.

A faixa 8 Longe, é uma das mais emblemáticas do disco por ser a primeira da minha parceira com o Gustavo Vilela. Eu já tinha composto a melodia muito antes, em 2012, mais ou menos. O Gustavo fez a letra em 2016 quando começamos a parceira das outras. De certa forma Longe foge um pouco ao meu estilo, mas ela foi muito importante para o meu trabalho como cancionista.

WG – Antes de gravar o EP, Estar ao Redor, como foram feitas as escolhas de Luisa Lacerda e Ilessi para atuarem como vocalistas?

PFP – Eu já conhecia a Luísa pelo Instagram e adorava o seu trabalho. O encontro se deu através de um amigo ao qual eu mandei as canções para que ela ouvisse. A Ilessi foi através da Luísa, que logo me impressionou por sua voz maravilhosa. Foi uma dádiva contar com essas duas brilhantes cantoras no disco, sobretudo para um compositor que está fazendo sua estreia como cancionista, uma felicidade enorme pra mim.

WG – Que músicos participaram das gravações? Quanto tempo demorou, desde o início até a mixagem?
PFP – Todos os músicos do disco eu já tinha trabalhado antes, todos espetaculares. Foi um prazer enorme contar com a presença desses músicos fantásticos: Pedro Franco, no vioão, Hugo Pilger no cello, Priscila Rato no violino, Marco Catto na viola, Rômulo Barbosa na flauta, Batista Jr no clarinete, Pablo Arruda no baixo, Ajurinã Swarg na percussão e Eduardo Sodré em ‘Longe’. As gravações foram feitas no meio da pandemia, então não obedeceram o padrão, tem faixas do disco que cada músico gravou de um lugar e num tempo diferente. Acho que desde a primeira gravação do Baião de Nós com a Luísa até o início da mixagem foram uns 4 meses. Gostaria de ressaltar também o incrível trbalho de Felipe Larrosa Moura na mixagem.

WG – Que você está projetando quanto à divulgação de Estar ao Redor? Pretendo fazer algum clip ou show?

PFP – A ideia é de fazer shows quando tudo voltar ao normal; ainda não penso em fazer clip, talvez futuramente. A divulgação agora é muito pelas redes sociais e outros veículos de comunicação.

WG – Que está projetando para o futuro? Continuará nas linhas das canções ou tocar dentro da linha instrumental com pequena formação ou tudo junto e misturado?

PFP – Acho que o meu momento agora está nas canções; tenho muitas outras prontas e pretendo gravá-las ano que vem. Tenho feito canções com outros letristas também, assim como tenho escrito letras para as minhas melodias. Tenho um projeto de um Single com a Leila Pinheiro que deve ser gravado em breve: uma honra enorme pra mim. São muitas portas se abrindo nesse universo maravilhoso das canções.